Entenda o que diz a lei sobre aborto legal no Brasil
O aborto é autorizado em três casos no Brasil: gravidez decorrente de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto.
Nas demais situações, a interrupção da gravidez é considerada crime, de acordo com o Código Penal, de 1940. A legislação estabelece que a mulher que provocar um aborto em si mesma pode ser condenada a pena de 1 a 3 anos de prisão.
Foi o Código Penal que fixou a possibilidade de aborto legal em caso de estupro. Já a interrupção da gravidez em caso de anencefalia do feto só foi permitida a partir de 2012, após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).
Mulheres que atendem a esses critérios, porém, têm enfrentado obstáculos para ter acesso ao aborto legal no país.
O caso chegou à Justiça, e a magistrada Joana Ribeiro Zimmer, do TJ-SC (Tribunal de Justiça de Santa Catarina) e a promotora Mirela Dutra Alberton, do MP-SC (Ministério Público de Santa Catarina), tentaram induzir a menina a desistir do aborto legal, conforme revelou reportagem do site The Intercept. Nesta terça-feira (21), o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) informou que apura a conduta da juíza.
Advogada da família da menina, Daniela Felix ingressou nesta terça com um habeas corpus no TJ-SC para garantir que a menina tenha direito ao aborto legal, sem qualquer impedimento devido ao tempo de gestação (ela está para entrar na 29ª semana).
Confira respostas a dúvidas recorrentes sobre aborto legal no país.
Em quais casos o aborto é permitido no Brasil?
Em caso de gravidez decorrente de estupro; risco à vida da gestante; e anencefalia do feto.
Há prazo para a interrupção da gravidez?
A legislação brasileira nada diz sobre a idade gestacional, ou seja, não impõe prazo limite para a realização do aborto legal.
Embora a OMS (Organização Mundial da Saúde) defina o aborto como a interrupção da gravidez antes do início da 22ª semana de gestação, norma técnica do Ministério da Saúde para casos de estupro recomenda "limitar o ingresso para atendimento ao aborto previsto em lei com 20 semanas de idade gestacional".
O documento, intitulado Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes, traz apenas orientações aos profissionais da saúde e não possui força de lei.
"As orientações da OMS e do Ministério da Saúde servem para orientar a criação de políticas públicas gerais de forma a preservar, em cenário ideal, o direito da mulher. Não são orientações, portanto, que restringem direitos e não podem ser interpretadas dessa forma", afirma Eloísa Machado de Almeida, professora da FGV Direito SP.
"Se há uma circunstância que impede o atendimento até esse prazo, serviços e equipes especializadas devem garantir o direito em outras condições. Juridicamente, não há empecilhos para a realização do procedimento", acrescenta.
Nos casos de risco à vida da mulher ou anencefalia do feto, não há recomendação sobre idade gestacional máxima para a interrupção da gravidez.
Como fazer um aborto legal?
O Código Penal não exige qualquer documento para interromper uma gravidez decorrente de estupro, basta o consentimento da mulher ou de seu responsável legal.
"A lei é muito clara e não exige relato à polícia, autorização judicial, audiência, nada disso. É um direito à mulher, uma questão de dignidade, humanidade e saúde", afirma a professora da FGV.
Na prática, porém, as mulheres enfrentam obstáculos para ter acesso ao aborto legal. Há relatos de hospitais que exigem apresentação de BO (boletim de ocorrência) ou exame de corpo de delito.
Em casos de anencefalia do feto, basta um laudo médico atestando a condição.
O hospital pode informar a polícia sobre o aborto justificado por estupro?
Embora o Código Penal não estabeleça necessidade de aviso, uma portaria publicada em 2020 pelo Ministério da Saúde orienta que médicos informem a polícia caso atendam mulheres que buscam interromper a gestação decorrente de estupro.
A portaria, que não tem força de lei, foi muito criticada por especialistas, que argumentam que a medida viola a previsão de sigilo em atendimentos de saúde e aumenta as chances de a mulher recorrer ao aborto ilegal.
"O Ministério da Saúde sob o governo Bolsonaro abandonou a ciência em várias áreas, não só na Covid. Tenta fazer o mesmo desorganizando os protocolos de atendimento à mulher e os programas de saúde sexual e reprodutiva. Tenta criar empecilhos para o aborto legal, contaminando a área técnica com ideologia fundamentalista que ignora a lei", afirma a professora Eloísa Machado de Almeida.
Como é o procedimento?
De acordo com o Ministério da Saúde, a escolha entre os diferentes métodos disponíveis depende de avaliação da equipe médica a respeito dos riscos e benefícios de cada opção e preferência da mulher, bem como suas condições clínicas e psicológicas.
A interrupção da gravidez pode ser feita, por exemplo, por meio de medicamentos ou aspiração uterina manual ou elétrica.
O médico pode se negar a realizar um aborto legal?
Se alegar objeção de consciência, sim. De acordo com o Código de Ética Médica, o profissional pode "recusar a realização de atos médicos que, embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua consciência".
Em alguns casos, porém, não cabe a objeção de consciência: quando há risco de vida para a mulher; quando não há outro médico que possa fazer o procedimento garantido por lei; e no atendimento de complicações derivadas de aborto inseguro, por se tratar de caso de urgência.
PERIGOS DA GRAVIDEZ EM CRIANÇAS
Quais os riscos de uma gravidez aos 11 anos?
A gestante pode desenvolver anemia, hipertensão, pré-eclâmpsia, parto prematuro. Para o bebê, há chances maiores de problemas respiratórios e más-formações.
Por que é considerada uma gravidez de risco?
Do ponto de vista físico, uma criança nessa idade não tem ainda o corpo preparado para uma gestação. A estrutura óssea da bacia, por exemplo, leva de dois a três anos após a primeira menstruação para se consolidar.
Como é feito o parto nesses casos?
Na maioria dos casos, a cesárea é mais indicada pela desproporção entre a cabeça do bebê e a bacia ainda em fase de desenvolvimento.
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Fonte: Folha de São Paulo
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress