Consternação nacional: Brasil perde Preta Gil, símbolo de coragem, arte e resistência

por Antônio Luiz Moreira Bezerra publicado 21/07/2025 07h00, última modificação 21/07/2025 08h35
Filha do cantor e ex-ministro Gilberto Gil, Preta nasceu do ventre da música e do ativismo.

O Brasil amarga tristeza desde este domingo, 20 de julho. Aos 50 anos, partiu Preta Gil, cantora, empresária, comunicadora e símbolo de uma geração que lutou com arte, coragem e afeto contra preconceitos, injustiças e doença. Sua morte foi confirmada após uma batalha pública e comovente contra um câncer no intestino, travada desde janeiro de 2023.

 

Filha do cantor e ex-ministro Gilberto Gil, Preta nasceu do ventre da música e do ativismo. Natural do Rio de Janeiro, ela foi batizada com um nome que virou bandeira. “Na minha casa, Preta se tornou nome próprio”, declarou Gil em uma das muitas homenagens que fez à filha ao longo dos anos. Esse nome, transformado em identidade e símbolo de orgulho racial, refletia exatamente quem ela era: potente, autêntica, inabalável.

 

Preta Gil foi muito além da linhagem de onde veio. Artista de voz firme e presença marcante, sua carreira foi construída em múltiplas frentes — da música à televisão, da publicidade ao Carnaval. Sua discografia reúne seis álbuns e parcerias com nomes como Ana Carolina, Anitta, Ivete Sangalo, Lulu Santos, Pabllo Vittar e Thiaguinho. Nas ruas do Rio, seu Bloco da Preta arrastava multidões a cada fevereiro, tornando-se um dos maiores do Carnaval carioca.

 

Mas Preta era mais que cantora: era uma voz ativa contra o racismo, a gordofobia, o machismo e a LGBTfobia. Uma artista que nunca se calou. Declaradamente feminista, Preta transformou sua visibilidade em trincheira política e amorosa — para acolher, ensinar, provocar e resistir. Sua atuação também foi marcante na publicidade, com a criação da agência Mynd, voltada para o trabalho com influenciadores digitais e artistas independentes.

 

Em janeiro de 2023, ela tornou pública a luta contra o câncer. Mesmo diante das dores, da septicemia, da UTI, da cirurgia que lhe retirou o reto e lhe trouxe a bolsa de ileostomia, Preta não escondeu nada. Transformou a vulnerabilidade em potência, inspirando milhares de pessoas com relatos sinceros, postagens corajosas e sorrisos que desafiavam a gravidade da doença.

 

“Sim, eu uso bolsa de ileostomia e não tenho vergonha de mostrar, pois essa bolsinha salvou minha vida”, escreveu em uma de suas publicações mais emocionantes. E mesmo abalada, ainda foi capaz de denunciar traições e rompimentos que vieram junto com o tratamento. Preta foi mulher em sua totalidade: forte, frágil, exposta, digna.

 

Em agosto de 2024, a doença deu sinais de retorno. Novos tumores e metástases desafiaram sua saúde e reacenderam a luta, que seguiu com bravura e esperança até os últimos dias. “Ela é uma paciente extremamente otimista, e isso ajuda no tratamento”, disse o cardiologista Roberto Kalil, que acompanhou sua jornada.

 

Preta Gil parte deixando o filho Francisco, a neta Sol, uma legião de amigos e fãs, e uma história marcada por afeto, representatividade e empoderamento. Vai-se a artista, fica a inspiração. Sua voz ecoará nos blocos, nos palcos, nas redes, nos corações.

 

O país não perdeu apenas uma cantora. Perdeu uma mulher que ousou viver sem pedir licença, que nos ensinou a rir, a lutar e a amar — mesmo com dor. Preta Gil é eternidade. E sua luz, agora, brilha com ainda mais força.


Fonte: Clique PI - Imagem: Tânia Rêgo/Agência Brasil